O texto a seguir é o prólogo da obra Primeiros cantos, em que o próprio autor, Gonçalves Dias, traça o perfil de sua poética. Leia-o e, depois, faça o que se pede.


Primeiros Cantos (Prólogo)

Dei o nome de Primeiros Cantos às poesias que agora publico, porque espero que não serão as últimas.

Muitas delas não têm uniformidade nas estrofes, porque menosprezo regras de mera convenção; adotei todos os ritmos da metrificação portuguesa, e usei deles como me pareceram quadrar melhor com o que eu pretendia exprimir. Não têm unidade de pensamento entre si, porque foram compostas em épocas diversas – debaixo de céu diverso – e sob a influência de impressões momentâneas. Foram compostas nas margens viçosas do Mondego e nos píncaros enegrecidos do Gerez – no Doiro e no Teia – sobre as vagas do Atlântico, e nas florestas virgens da América. Escrevi-as para mim, e não para os outros; contentar-me-ei, se agradarem; e se não... é sempre certo que tive o prazer de as ter composto.

Com a vida isolada que vivo, gosto de afastar os olhos de sobre a nossa arena política para ler em minha alma, reduzindo à linguagem harmoniosa e cadente o pensamento que me vem de improviso, e as ideias que em mim desperta a vista de uma paisagem ou do oceano – o aspecto enfim da natureza. Casar assim o pensamento com o sentimento – o coração com o entendimento – a ideia com a paixão – cobrir tudo isto com a imaginação, fundir tudo isto com a vida e com a natureza, purificar tudo com o sentimento da religião e da divindade, eis a Poesia – a Poesia grande e santa – a Poesia como eu a compreendo sem a poder definir, como eu a sinto sem a poder traduzir.

O esforço – ainda vão – para chegar a tal resultado é sempre digno de louvor; talvez seja este o só merecimento deste volume. O Público o julgará; tanto melhor se ele o despreza, porque o Autor interessa em acabar com essa vida desgraçada, que se diz de Poeta.

Rio de Janeiro, julho de 1846.

DIAS, Gonçalves. Primeiros cantos (Prólogo).
Disponível em: <www.casadobruxo.com.br/poesia/g/goncalves01.htm>.
Acesso em: 25 fev. 2018.

1. Que traços destacados pelo autor prevalecem nos textos poéticos que ele escreve? Explique sua resposta.

Segundo o poeta, em sua escrita, destacam-se a liberdade formal, a imaginação criadora e a valorização do indivíduo, de suas contradições e das emoções particulares e circunstanciais que o rodeiam.

2. As ideias do texto são concluídas por meio da afirmação de que é o leitor que será o responsável por julgar as obras do referido poeta. Qual é a opinião do poeta em relação a esse julgamento? Comente sua resposta.

Para o poeta, o leitor será o único responsável pelo julgamento de sua escrita. E, se o julgamento for negativo, melhor será, pois, dessa forma, o poeta deixará de escrever, algo que ele almeja.

3. Classifique, a seguir, as figuras de sintaxe em destaque nos trechos extraídos do texto lido.

a) “Dei o nome de Primeiros Cantos às poesias que agora publico [...]”.

Elipse (eu).

b) “Com a vida isolada que vivo [...]”.

Pleonasmo.

c) “[...] cobrir tudo isto com a imaginação, fundir tudo isto com a vida e com a natureza, purificar tudo com o sentimento da religião e da divindade, eis a Poesia [...]”.

Assíndeto.

4. Classifique as figuras de sintaxe dos excertos seguintes.

a) “Capitu parece vencer-se a si mesma” (Machado de Assis)

Pleonasmo.

b) “Da lua os claros raios rutilavam” (Camões)

Hipérbato ou inversão.

c) Pedro é assim mesmo: come, bebe, vai embora, não diz nada.

Assíndeto.

d) “Corria gente de todos os lados, e gritavam.” (Mário Barreto)

Silepse de número.

e) Quando a gente é novo, gosta de se aparecer.

Silepse de gênero.

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